O eterno ‘escudeiro’ Wout Poels (Bahrain Victorious) estreou-se hoje, aos 35 anos, a ganhar em grandes Voltas, na 15.ª etapa do Tour, um triunfo merecido para um ciclista que dedicou a sua carreira a trabalhar para outros.

Em Saint-Gervais Mont-Blanc, a última chegada em alto da 110.ª Volta a França, onde Jonas Vingegaard (Jumbo-Visma) e Tadej Pogacar (UAE Emirates) redefiniram a palavra ‘empate’, o discreto corredor neerlandês aguentou a perseguição do ‘super’ Wout van Aert (Jumbo-Visma) para conquistar a sua primeira etapa numa ‘grande’, à 21.ª participação.

“Estive por quatro vezes na equipa vencedora [do Tour], o que é realmente algo fantástico de se conseguir, mas, infelizmente, nunca pude lutar por uma vitória de etapa. Finalmente, pude fazê-lo hoje. É ótimo”, disse Poels, gregário da Sky nos triunfos de Chris Froome (2015 e 2016), Geraint Thomas (2018) e Egan Bernal (2019) na ‘Grande Boucle’.

Talvez ‘ajudado’ pelo falecido Gino Mäder, como reconheceu, o experiente neerlandês aventurou-se na fuga do dia, atacou ainda antes da subida final e foi ao limite para impedir a aproximação de Van Aert, novamente segundo, hoje a 02.08 minutos do vencedor. Outro fugitivo, o francês Mathieu Burgaudeau (TotalEnergies), foi terceiro na meta, a exatos três minutos de Poels.

Mais de seis minutos depois de o também vencedor da Liège-Bastogne-Liège (2016) terminar a etapa, Pogacar e Vingegaard entretiveram-se a sprintar, em novo episódio da sua luta por segundos, mas cortaram a meta quase lado a lado, mantendo a geral inalterada: o dinamarquês da Jumbo-Visma lidera com 10 segundos de vantagem sobre o esloveno, que viu hoje o seu colega Adam Yates aproximar-se do espanhol Carlos Rodríguez (INEOS), terceiro a 05.21.

Os 179 quilómetros entre Les Gets e Saint-Gervais Mont-Blanc começaram agitados: as diversas tentativas de fuga provocaram a separação do pelotão, com Sepp Kuss (Jumbo-Visma), Pello Bilbao (Bahrain Victorious) e Felix Gall (AG2R Citroën), três dos homens do top 10 da geral à partida, a ficarem momentaneamente num segundo grupo.

Os ataques continuaram indefinidamente até que, decorridos que estavam 50 quilómetros, finalmente um numeroso grupo conseguiu ‘afirmar-se’, beneficiando de uma queda, causada por um espetador, que ‘descarrilou’ o ‘comboio’ da Jumbo-Visma e deixou no chão, entre outros, Kuss ou o colombiano Egan Bernal, campeão do Tour2019.

Nesse momento, Julian Alaphilippe (Soudal Quick-Step) e Alexey Lutsenko (Astana) ainda seguiam isolados na dianteira, sendo perseguidos por um ‘mini-pelotão’ de quase 40 ciclistas, onde estavam, além de Poels, ‘WVA’ e Burgaudeau, Mathieu Van der Poel (Alpecin-Deceuninck), Michal Kwiatkowski (INEOS), Thibaut Pinot (Groupama-FDJ), Magnus Cort, Rigoberto Urán e Neilson Powless (EF Education-EasyPost), Mikel Landa (Bahrain Victorious), Giulio Ciccone (Lidl-Trek), Warren Barguil (Arkéa-Samsic), Guillaume Martin (Cofidis), ou o português Rui Costa (Intermarché-Circus-Wanty).

Abalada pela queda, a Jumbo-Visma abdicou totalmente da perseguição, permitindo que os fugitivos, que se uniram a 86 quilómetros da meta, ganhassem mais de oito minutos, uma margem que era ligeiramente menor quando iniciaram a subida ao Col de la Croix Fry.

Foi precisamente na segunda de três contagens de primeira categoria da jornada que Costa atacou; o antigo campeão mundial (2013) ultrapassou Marco Haller (BORA-hansgrohe) e isolou-se na frente de corrida, mas foi apanhado ainda antes do alto de la Croix Fry – perderia na meta 21.27 minutos para o seu antigo companheiro de escapada.

Na descida do Col des Aravis, atacou Van Aert, levando consigo Poels, Marc Soler (UAE Emirates) e Krists Neilands (Israel-PremierTech), que caiu e deixou apenas três corredores na dianteira, com uma vantagem que era superior a um minuto para os perseguidores à entrada do Côte des Amerands.

A contagem de segunda categoria que antecedia a escalada final foi aproveitada pelo experiente Poels para ‘descarregar’ o belga da Jumbo-Visma, enquanto lá atrás a UAE Emirates passava para a frente do grupo do camisola amarela, com a aceleração a deixar em dificuldades novamente Thomas Pidcock (INEOS), mas também Pello Bilbao (Bahrain Victorious).

Mas seria o Saint-Gervais Mont-Blanc a ‘condenar’ as aspirações de Jai Hindley (BORA-hansgrohe), quarto na geral à partida e quinto à chegada – está a 06.38 e mais longe do pódio final -, e de Simon Yates (Jayco AlUla). Também Rodríguez (INEOS) perdeu, uma e outra vez, a roda de Vingegaard, Pogacar e Adam Yates, que deixou mesmo para trás os dois primeiros da geral e foi em busca do último lugar do pódio, sem sucesso, uma vez que é quarto a 05.40.

Em mais uma jornada em que os dois últimos vencedores do Tour andaram ‘colados’, o líder da juventude arrancou a 900 metros da meta e foi incapaz de surpreender o camisola amarela. Neste ‘jogo’ excessivamente calculista protagonizado pelos dois, só mesmo o contrarrelógio após o dia de descanso poderá desempatar: são apenas 22,4 os quilómetros, entre Passy e Combloux, que na terça-feira ‘libertarão’ Vingegaard e Pogacar da marcação um do outro e deslindarão quem, afinal, está melhor de forças.

O ‘crono’ será também o momento para Nelson Oliveira brilhar; o especialista português da Movistar foi hoje 71.º, a 27.55 minutos de Poels, e é 52.º da geral, a 02:20.58 horas do camisola amarela, com Rui Costa 30 lugares mais abaixo, a 03:05.29.