Depois de concluídos dois terços da Volta a França, a última semana vai levar o pelotão até Paris para consagrar os vencedores. Nesta altura a 'amarela' pertence a Vingegaard, mas Pogacar e Thomas ainda não deitaram a toalha ao chão e prometem espetáculo nos Pirenéus para roubar a liderança a um Vingegaard que nesta altura já não tem dois dos seus principais ‘escudeiros’.

Bélgica de amarelo e o regresso dos neerlandeses voadores

A 109ª edição da Volta a França arrancou no passado dia 1 de Julho em Copenhaga. Um contrarrelógio de 13 quilómetros debaixo de chuva acabou por condicionar de certa forma a performance dos principais favoritos. Já perto do final, e quando se esperava o triunfo do belga Wout Van Aert, outro belga, Yves Lampaert venceu o prólogo e conquistou a primeira camisola amarela da prova.

As duas etapas seguintes, ainda corridas em solo dinamarquês, ficaram marcadas pelo regresso aos triunfos de dois sprinters envolvidos em polémica recentemente. Dois neerlandeses, Fabio Jacobsen e Dylan Groenewegen venceram a segunda e terceira etapas, respetivamente.

Em Agosto de 2020 os dois estiveram envolvidos num arrepiante acidente na Volta a Polónia, e que pusera Jacbosen em coma induzido devido às múltiplas e graves lesões. O acidente terá acontecido, de acordo com a UCI, devido a uma manobra perigosa de Groenewegen e que levou a uma suspensão do neerlandês de nove meses.

Praticamente dois anos depois, os dois ciclistas voltaram às vitórias em grandes voltas, ambas ao sprint. Apesar disso foi Wout van Aert quem saiu da Dinamarca de amarelo. O ciclista da Jumbo-Visma chegou à liderança da prova graças às bonificações conquistadas nos sprints finais.

Van Aert dá espetáculo, Pogacar não dá hipóteses

Chegado a França, a primeira semana do Tour trouxe as primeiras grandes dificuldades. Depois de sair da Dinamarca de amarelo, Wout van Aert continuou a animar a corrida; na quarta etapa, e depois de uma ligeira mas íngreme subida, a estratégia da Jumbo deixou o belga totalmente só na descida, acabando por chegar isolado à meta em Callais.

A ronda seguinte trouxe o primeiro grande desafio com 157 quilómetros polvilhados de sectores de estrada empedrada e que começou a fazer uma primeira triagem no que à classificação diz respeito. Um dos azarados do dia foi Primoz Roglic; o ciclista esloveno sofreu uma violenta queda num dos sectores de pavés, acabando por deslocar o ombro e perder muito tempo. A etapa terminaria com a vitória de Simon Clarke com Tadej Pogacar a conseguir ganhar treze segundos à concorrência com o seu sétimo lugar.

O ciclista esloveno continuou em modo de ataque na tirada seguinte, a mais longa do Tour. Depois de quase 220 quilómetros, Pogacar aproveitou a subida no último quilómetro para vencer a tirada e, graças às bonificações no final da etapa, aumentar a vantagem perante os mais diretos adversários.

A primeira semana terminaria com a chegada à Super Planche de Belles-Filles, uma subida duríssima, com algumas rampas acima dos 20% de inclinação. Nos últimos quilómetros, e quando se esperava a vitória do alemão Lennard Kamna da Bora, Jonas Vingegaard atacou nos últimos metros, levando à resposta imediata de Pogacar.

O esloveno acabou por ultrapassar o seu adversário em cima da linha, vencendo a segunda etapa consecutiva e somando mais pontos de bonificação para reforçar a sua camisola amarela.

O devastador ataque do Cavaleiro da Dinamarca

As duas etapas seguintes tiveram em comum a procura constante de Pogacar em ganhar tempo aos seus adversários. Na oitava tirada, vencida por Wout van Aert, o esloveno alcançou o terceiro lugar, somando mais quatro segundos à sua vantagem perante Vingegaard.

O esloveno não conseguiu repetir a proeza na etapa seguinte, naquele que foi o primeiro contacto com os Alpes, uma vez que o dinamarquês chegou colado e não permitiu nenhuma vantagem ao adversário.

Após o segundo dia de descanso, a corrida retomou em plenos Alpes. Na fuga do dia esteve Lennard Kamna que, até certa altura, chegou a ser virtual camisola amarela, dada a vantagem da fuga sobre o pelotão. A equipa UAE acabou por reagir, segurando a liderança de Pogacar por meros onze segundos; o esloveno voltou a tentar ganhar mais alguns segundos no final da etapa mas teve resposta à altura de Vingegaard.

A 11ª etapa trouxe uma das mais espetaculares tiradas de recentes edições do Tour. Com várias e duras montanhas pela frente (Col du Télégraphe, Col du Galibier) a equipa Jumbo-Visma montou uma estratégia de ataque total e enérgico à liderança de Pogacar; fosse a subir, fosse a descer, a ordem era para Vingegaard e Roglic lançarem ataques alternadamente, algo que obrigou Pogacar, quase sempre sem apoio da equipa, a responder.

Este desgaste, a juntar com o acumulado de vários dias de sprints em busca de segundos, deixou Pogacar sem pernas para responder ao demolidor ataque de Jonas Vingegaard nos últimos cinco quilómetros. Tal como no romance de Alice Vieira, o Cavaleiro da Dinamarca seguiu a luz intensa da camisola amarela e partiu para a vitória, ganhando três minutos a Pogacar na subida, deixando o esloveno apeado e com um atraso de mais de dois minutos na classificação geral.

A resposta do ‘humano’ e a sombra amarela

As etapas seguintes serviram para perceber se o ‘Super’ Pogacar tinha apenas tido um dia mau ou se era algo mais. A resposta não se fez esperar; na mítica subida ao Alpe D´Huez na 12ª tirada, o líder da UAE atacou por várias vezes na subida final mas cada uma delas teve a devida resposta de Vingegaard que nunca deu um milímetro de vantagem ao adversário.

Destaque da tirada para o vencedor Thomas Piddcock; o birtânico da Ineos recuperou mais de dois minutos à frente da corrida em plena descida, algo que lhe permitiu chegar ao Alpe D´Huez em vantagem e alcançar o seu primeiro triunfo na Volta a França.

Nas etapas seguintes, e sempre que se deparavam perante alguma dificuldade, Pogacar não engendrava a oportunidade e atacava; todavia o esloveno teve sempre consigo a ‘sombra amarela’ Jonas Vingegaard, não permitindo qualquer veleidade ao adversário.

Na última semana da prova, o pelotão enfrentará os Pirinéus e ainda um contra-relógio de 40 quilómetros que deverão clarificar todas as classificações e consagrar todos os vencedoras. Com as respetivas equipas já desfalcadas devido a covid ou acidentes, Vingegaard e Pogacar vão enfrentar-se num duelo que se prevê animado até à última pedalada.