Soava o apito final do Sporting-Belenenses e as primeiras piadas começavam a surgir nas redes sociais. Até a mítica frase de Marco Fortes – aquela que dizia que, de manhã, só se está bem na caminha – foi utilizada para resumir um jogo matinal em que o Sporting, bem vistas as coisas, resolveu ‘dormir na forma’. Porque, de facto, este era um encontro atípico pelo horário a que foi disputado, a que também não ajudou o ritmo mastigado, para não dizer aborrecido, de grande parte dos 90 minutos. Só que foi muito mais do que isso. Porque este também foi o dia do despertar de um Belenenses que há 62 anos (!) não vencia os ‘leões’ fora de portas. Quando ainda nem sequer havia Estádio José Alvalade.
O jogo:
De um lado, uma formação que não perdia há onze jornadas – nove vitórias e dois empates – do outro, um conjunto que há sete jogos que só sabia perder e que não havia marcado qualquer golo nos últimos três duelos na condição de visitante. Era tudo a pedir para que os ‘leões’ entrassem em piloto automático. Sem o rasgo de Gelson – rendido por Matheus Pereira - e Podence, esse cenário ganhava ainda mais força.
Não foi, portanto, surpreendente testemunhar a lentidão com que a bola era trocada, o ritmo pachorrento a que as jogadas se desenrolavam durante a primeira parte. Do Sporting, apenas um remate, de Adrien, ao minuto 27 - Bas Dost teimava em chegar atrasado a todos os cruzamentos – e muito, muito poucas ideias. Já o Belenenses tinha os seus homens mais compactos e encostados à baliza de Ventura, conseguindo ainda algumas jogadas de contra-ataque, mas sem grande incómodo para Rui Patrício. Alvalade quase encheu mas devem ter sido poucos os adeptos que não soltaram um bocejo.
Antes do jogo, falava-se na possibilidade de a equipa ‘leonina’ aumentar a pressão sobre o FC Porto, que na véspera havia empatado com o Marítimo - em caso de vitória, os sportinguistas ficariam a apenas três pontos do terceiro lugar. Jorge Jesus sabia disso, tanto que o puxão de orelhas ao intervalo teve efeitos imediatos. A equipa da casa entrou mais atrevida e foi uma questão de tempo até as redes da baliza de Ventura balançarem: cruzamento de Bryan Ruiz na esquerda, a bola bate na trave, e Bruno César, de carrinho, encosta para o primeiro da partida (52′).
O Sporting, como seria de esperar, acelerou em direção ao 2-0, com Domingos Paciência a aproveitar para reforçar a linha ofensiva, lançando Maurides. Foram, no entanto, os defesas que estiveram na origem da reviravolta dos ‘azuis’ do Restelo. A começar pela ‘mãozinha’ de Matheus Pereira, a tocar a bola com o braço na área. A conversão ficou a cargo de Abel Camará, a libertar toda a sua raiva nos festejos, depois de uma semana marcada pela relação difícil com alguns adeptos belenenses. Mais tarde ficou-se a saber que seria mesmo o último golo do jogador no emblema da cruz de Cristo.
Jesus arregaçou as mangas e lançou Campbell para o lugar de Matheus Pereira, e Castaignos por troca com Bryan Ruiz, mexidas que o próprio técnico viria a lamentar mais tarde. O holandês foi responsável pelo falhanço do jogo, quiçá da jornada, a atirar com toda a força por cima da trave, quando estava isolado perante a hesitação de Ventura. Em sentido inverso, Domingos Paciência foi bem mais feliz nas substituições, sobretudo com a entrada de Benny.
Foi dos pés do médio português, de apenas 20 anos, que saíram os dois livres que consumaram a reviravolta do Belenenses, concretizados por dois centrais, primeiro Dinis Almeida, num movimento à avançado (83’), e cinco minutos depois, Gonçalo Silva, após assistência de Maurides, a fechar as contas. Três lances de bola parada, três golos dos ‘azuis’ do Restelo e um ‘leão’ a ver jogar. Houve quem esperasse 62 anos por uma manhã assim.
O momento:
Golo de Dinis Almeida: Foi o momento de viragem no jogo. Ao minuto 83, pouco depois de uma perdida inacreditável de Castaignos, o Belenenses chegou ao 2-1, na sequência de um livre na esquerda, cobrado por Benny. A bola sofre um ligeiro ressalto em Coates e sobra para Dinis Almeida que, num remate acrobático em esforço, atirou para o fundo da baliza. Balde de água fria em Alvalade, quando ainda estava mais para vir.
Casos do jogo:
Falta de Bruno César sobre Edgar Ié: Ao minuto 18, fica a ideia de que o médio ‘leonino’ travou o defesa do Belenenses em falta, no limite da área, quando este seguia em posição privilegiada para a baliza de Rui Patrício. Os jogadores visitantes reclamaram falta e cartão para o brasileiro, mas Bruno Paixão mandou seguir. Nada a dizer na análise ao lance da grande penalidade cobrada por Camará.
Os melhores:
Gonçalo Silva: Foi o dono da defesa do Belenenses, conseguindo anular Bas Dost, o que não é tarefa para qualquer um. Revelou-se intransponível no jogo aéreo e influente no ataque, com o golo apontado já perto do minuto 90.
Domingos Paciência: Conseguiu a primeira vitória no comando técnico dos ‘azuis’ e logo na casa de outra equipa que já teve oportunidade de orientar. No duelo do banco, ganhou sem espinhas a Jorge Jesus, principalmente com as substituições que operou na equipa.
Bruno César: O melhor elemento em campo do Sporting. Incansável, fez com que a equipa subisse no terreno, tendo sido o mais produtivo a nível ofensivo. Bem no lance do 1-0, ao perceber a jogada e, desse modo, antecipar-se a Ventura.
Os piores:
Matheus Pereira e Bas Dost: O primeiro, pelo erro que originou a grande penalidade favorável ao Belenenses, o segundo, por ter estado completamente ausente da partida, muito também por culpa dos defesas adversários, que não lhe deram grande margem de manobra. Falta-lhe mais mobilidade na área.
As reações:
Bruno de Carvalho: "Infelizmente foi um jogo deprimente para o Sporting"
Jesus: "Jogadores que entraram não melhoraram a equipa, pelo contrário"
Domingos Paciência: "A equipa tem tido um comportamento exemplar"
Paulo Oliveira: "A este nível, alguma falta de rigor paga-se caro"
Gonçalo Silva: "Hoje fizemos história"
Curiosidades (via playmakerstats)
- Há 2 meses que o Belenenses não vencia qualquer jogo: a última vitória fora de portas foi em Arouca (1-2), em fevereiro
- É a primeira vitória de sempre do Belenenses no Estádio José Alvalade (antigo e novo)
- Foi a primeira grande penalidade assinalada em Alvalade contra o Sporting em 2016/17; no total, foi o quarto golo de penálti que os ‘leões’ sofreram esta época
- Bruno César chega aos 10 golos pelos ‘leões’ e iguala Adrien e Gelson como o terceiro melhor marcador (6) do Sporting em 2016/17
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