Dois futebolistas israelitas que jogam em clubes da primeira divisão da Turquia estão no centro de uma polémica por mostrarem o seu apoio aos reféns no conflito entre Israel e o Hamas em Gaza.
Libertado esta segunda-feira e aguardando julgamento, Sagiv Jehezkel, de 28 anos, jogador do Antalya, foi preso na véspera no final de uma partida por ter mostrado um mensagem numa ligadura no punho onde se lia "100 dias. 07/10", aludindo à data do ataque cometido pelo movimento islamista palestiniano Hamas no sul de Israel e ao início da guerra na Faixa de Gaza.
O ministro turco do Interior, Ali Yerlikaya, anunciou na rede social X que Sagiv Jehezkel tinha abandonado a Turquia, ao final da tarde de domingo. O jogador já chegou a Israel.
Outro jogador israelita que atua no campeonato turco, Eden Karzev, de 23 anos, também foi criticado pelo seu clube de Istambul, o Basaksehir, após publicar na rede social Instagram uma imagem que dizia em inglês.
"100 dias. 136 israelitas estão em cativeiro do grupo terrorista Hamas, há 100 dias. Tragam-nos de volta agora", refere a mensagem, acompanhada do número 100, desenhado com laços amarelos.
A conta do médio israelita é privada, mas muitos seguidores a que a ela têm acesso gravaram uma captura de ecrã com a mensagem divulgada no domingo pelo jogador, que replicava um comunicado da Federação sionista da Austrália.
O Başakşehir, conhecido por ser próximo da Presidência da Turquia, anunciou que ia abrir um processo disciplinar contra o seu jogador.
"Foi aberta uma investigação disciplinar a Eden Kartsev, por partilhar nas redes sociais uma mensagem contrária aos valores do nosso país e por transgredir os regulamentos disciplinares do clube", comunicou o Basaksehir, emblema da I Liga turca.
Israel criticou a prisão de Jehezkel, nesta que é mais um capítulo nas muito tensas relações entre as duas potências regionais.
"A Turquia tornou-se uma ditadura duvidosa, que vai contra os valores humanos e os valores desportivos. Quem detém um jogador de futebol por ato de identificação com 136 pessoas sequestradas, nas mãos de uma organização terrorista há mais de 100 dias, representa uma cultura de morte e ódio", disse o ministro das Relações Exteriores israelita, Israel Katz.
"Braço executivo do Hamas"
O ministro da Defesa israelita, Yoav Gallant, acusou Ancara de "agir como braço executivo do Hamas".
Um porta-voz do Ministério das Relações Exteriores de Israel indicou que Jehezkel poderá voltar ao seu país ainda esta segunda-feira.
Nesta altura não se sabe se o julgamento será realizado à revelia de Jehezkel ou se o jogador israelita voltará à Turquia.
Três jogadores israelitas jogam por clubes turcos: além de Jehezkel e Karzev, Ramzi Safuri - um árabe-israelita - também joga no Antalyaspor.
Desde o início do conflito, Israel instou os seus cidadãos a deixarem a Turquia devido ao forte sentimento pró-palestinos no país.
O presidente turco, Recep Tayyip Erdogan, um aliado tradicional da causa palestiniana, acusou em diversas ocasiões Israel de ser um "Estado terrorista" e considera o Hamas um "grupo de libertadores".
"Nem provocação nem falta de respeito"
Jehezkel defendeu-se das acusações e afirmou não ter provocado ninguém, segundo a emissora privada NTV, que teve acesso ao interrogatório policial.
"Não fiz nada para provocar ninguém. Não sou pró-guerra. Há israelitas mantidos como reféns em Gaza. Nunca desrespeitei ninguém desde que estou na Turquia. Quero que a guerra acabe. Por isso fiz aquele gesto [depois de marcar um golo]", disse o jogador no interrogatório à polícia.
No sábado, após marcar um golo no empate do Antalyaspor frente ao Trabzonspor, o internacional israelita mostrou a inscrição "100 dias 07/10" numa das proteções do seu pulso, em referência aos 100 dias após o ataque do movimento islamita palestiniano Hamas a Israel, a que se seguiu uma intervenção militar dos israelitas na Faixa de Gaza, enclave controlado pelo Hamas desde 2007.
O Antalyaspor, por sua vez, anunciou que vai afastar o jogador, acusando-o de "agir contra os valores do nosso país" e a Federação Turca de Futebol (TFF) criticou o seu comportamento "totalmente inaceitável".
A 07 de outubro, combatentes do Hamas – desde 2007 no poder na Faixa de Gaza e classificado como organização terrorista pelos Estados Unidos, a União Europeia e Israel – realizaram em território israelita um ataque de proporções sem precedentes desde a criação do Estado de Israel, em 1948, fazendo 1.139 mortos, na maioria civis, segundo o mais recente balanço das autoridades israelitas, e mais de 200 reféns.
Em retaliação, Israel declarou uma guerra para “erradicar” o Hamas, que começou por cortes ao abastecimento de comida, água, eletricidade e combustível na Faixa de Gaza e bombardeamentos diários, seguidos de uma ofensiva terrestre ao norte do território, que entretanto se estendeu ao sul.
A guerra entre Israel e o Hamas fez até agora na Faixa de Gaza mais de 23 mil mortos e mais de 59 mil feridos, na maioria civis, de acordo com o último balanço das autoridades locais, e cerca de 1,9 milhões de deslocados (cerca de 85% da população), segundo a ONU, mergulhando o enclave palestiniano sobrepovoado e pobre numa grave crise humanitária.
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