Foram 29 dias intensos, longe da família, poucas horas de sono, mas com a sensação de que a Rússia organizou um excelente campeonato do mundo. Não sou veterano nem júnior nisto de grandes competições fora de portas. Foram dois campeonatos do mundo (2014 e 2018), um campeonato europeu (2012), muitos jogos da Liga Europa (incluindo uma final de 2011 em Dublin com o FC Porto e SC Braga) e da Liga dos Campeões (incluindo uma final de 2010 em Madrid com o Inter de José Mourinho e o Bayern de Munique). Para nove anos de jornalista não está nada mal.
A Rússia não era nova para mim, estive lá há um ano e meio como turista, e dois dias depois de ter regressado a Portugal continuo a olhar para ela com fascínio. A 07 de junho, um dia depois de ter aterrado em Moscovo, os funcionários da embaixada portuguesa diziam-me que esta iria ser a melhor organização de sempre de um campeonato do mundo, “eles (russos) querem muito que isto corra bem e que as pessoas fiquem impressionadas”. Queriam tanto que até mandaram fabricar comboios novos para a competição, de forma a que os adeptos e jornalistas de todo o mundo pudessem deslocar-se de uma cidade para a outra com maior conforto, Estamos a falar de um país com 145 milhões de habitantes e 17 milhões km2 de área, a maior do mundo.
Os bilhetes para estes comboios FIFA eram grátis para quem estivesse devidamente acreditado (adepto ou jornalista) e realizasse marcação prévia. Além disso, os transportes públicos como comboios, metros ou autocarros, também eram de livre utilização. Para quem esteve na Rússia e teve de se deslocar entre cidades, este ‘free pass’ deu muito jeito na construção de um orçamento.
Muitos me perguntaram se eu tinha a resposta para a ausência - pelo menos até à data - de desacatos no Mundial. Estando eu pela segunda vez em solo russo, consigo dar essa resposta: a Rússia apenas reforçou o seu sistema de segurança, nada mais. Obviamente que existe uma segurança que não está à vista dos que por lá circulavam, mas as ações de revista e controlo de segurança foram rigorosamente os mesmos, sejam para entrar nas estações ferroviárias, centros comerciais ou praças públicas. Nada mudou, foram exatamente iguais aos que tive de enfrentar durante as minhas férias.
Quanto à gastronomia russa, bem, é impossível não gostar. Uma cozinha rica, que mostra a produção local, misturando técnicas europeias e asiáticas. Aliás, na Rússia, existem impostos altíssimos para quem importe produtos, ao contrário das baixas taxas para a produção local, fazendo com que haja um ciclo 100% nacional na cozinha russa. Exceção para produtos provenientes da Geórgia e Arménia, que são bem vindos e altamente recomendados na hora da degustação. Vinhos russos? Claro que os há e fiquem a saber que são muito parecidos com os que são produzidos no norte de Portugal.
Falemos então das pessoas que foram até à Rússia para viver um Mundial. No final do jogo entre Portugal e Uruguai, que ditou a eliminação da equipa das quinas, nas habituais entrevistas aos adeptos do SAPO Desporto, houve uma que me chamou a atenção, não porque fosse algo de novo, mas porque refletia exatamente o que pensava. Para aqueles que pensam o contrário, um jornalista também tem uma opinião quando não está a fazer o seu dever. Além das críticas deixadas à Federação Portuguesa de Futebol pela ausência de adeptos portugueses neste Mundial, ele disse isto e passo a citar:
“Temos adeptos do México e da Colômbia que não vêm apenas ao estádio, vêm para a Rússia. Existe uma coisa que se chama ‘vir para a Copa’ e em Portugal essa mentalidade não existe”.
Com isto, resume-se o que se passou na Rússia durante o tempo em que lá estive. Foram adeptos mexicanos a viajar de Moscovo para Sochi para ver um Portugal-Espanha, colombianos a encherem a Rua Arbat, uma via pedonal de aproximadamente um quilómetro situada no centro histórico da capital russa, para celebrar, conviver com outras nações, sem nunca descurar o apoio às suas seleções. Eles viram jogos de futebol, mas também conheceram um novo país e novas culturas.
No meu último dia em Moscovo, já com Portugal eliminado, fiz um pouco de turismo e quis visitar o Mausoléu de Lenine, na Praça Vermelha, mas foi-me impossível devido à grande quantidade de turistas que acordaram mais cedo do que eu. Desapontado por um lado, mas satisfeito por ver colombianos, ingleses, mexicanos, uruguaios, argentinos naquela fila a querer ver algo mais do que futebol. Realçar que faziam questão de estar orgulhosamente vestidos com as camisolas das suas seleções para serem facilmente reconhecidos.
Portugueses neste Mundial? Encontrei mais asiáticos com a camisola da seleção do que portugueses provenientes de Portugal. Emigrantes lusos e asiáticos conseguiram salvar (um pouco) a imagem de Portugal nos estádios, mas não na hora de cantar o hino. Realçar, uma vez mais, os corajosos adeptos portugueses que foram até Sochi (duas vezes), Moscovo e Saransk para apoiar a seleção.
Por último, um grande ‘spasiba’ (obrigado em russo) às pessoas com quem me cruzei ao longo destes 29 dias. Orgulhosamente russos e pouco habituados aos produtos americanos, excluindo Macdonalds, Burger King e Coca-Cola, foi-me difícil comunicar com eles e isso pode chegar a ser assustador quando se está perdido numa estação ferroviária às 23 horas, mas, nunca me abandonaram. Foram afáveis e prestáveis, mesmo com uma ‘app’ de tradução de voz pelo meio, e é deles que vou sentir mais falta. Porque o Mundial é apenas um pretexto para as pessoas se juntarem, celebrar a vida, e, nas pausas, assistir a um pouco deste espetáculo que é o futebol.
Do svidaniya
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