O sociólogo João Sedas Nunes explicou hoje à Lusa que o episódio racista de que foi vítima Marega (FC Porto) no domingo se inscreve em outros casos que comprovam que o racismo “é um traço constituinte da sociedade”.
“O episódio de domingo inscreve-se a outros episódios e diz-nos uma coisa muito simples: não vale a pena enfiarmos a cabeça na areia e não vermos o que é evidente, que na sociedade portuguesa o racismo é tutelar. Faz parte da vida quotidiana, não é excecional. Não a tornando prezável, digo que é banal”, afirmou.
Sedas Nunes respondia a questões da Lusa sobre os insultos racistas de que foi alvo o futebolista maliano Moussa Marega (FC Porto), no estádio do Vitória de Guimarães.
O futebolista pediu para ser substituído e retirar-se de campo ao minuto 71 do jogo da 21.ª jornada da I Liga, entre o FC Porto e o Vitória de Guimarães (2-1), depois de ter sido alvo de cânticos e gritos racistas por parte de adeptos da equipa minhota.
Na opinião do professor no departamento de Sociologia da Universidade Nova, “uma certa resistência ao reconhecimento do racismo, que em parte participa da própria reprodução” do mesmo, prende-se com a colocação do episódio racista “no prisma privado” do atleta.
Os termos utilizados pelas várias partes, entre eles os colegas de equipa, “são formas de negar a evidência”, não falando abertamente de racismo.
“Isso passou-se no domingo e passa-se, também, do ponto de vista institucional. Aí, nunca há um problema racista, quando o problema não é da natureza das relações interpessoais. São as instituições que, em Portugal, são racistas”, considerou Sedas Nunes.
O episódio “aconteceu no futebol, mas não é só do futebol, é um traço constituinte da sociedade portuguesa”, encontrando neste desporto “um magnífico palco para que tomem forma pública”.
Nas bancadas, há um efeito coletivo, porque “gritam todos em conjunto, o que confere uma coragem àqueles que, isolados em frente aos que hostilizam, não teriam”, ainda que não seja nos estádios “que o racismo se constitui”, antes algo “bem inscrito na sociedade portuguesa e não só”.
O sociólogo considerou ainda que não há “um aumento da violência no desporto”, talvez “da visibilidade”, tendo elencado “inúmeros relatos de invasões de campo e agressões a árbitros” nos anos 1960 e 1970 no futebol português.
No campo da violência, há, sim, “fenómenos novos, ligados à associação de alguns grupos criminosos aos clubes desportivos através das claques”, defendeu.
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