3 de março de 2020 - Momento caricato na sala de imprensa em imprensa em Famalicão. Jorge Silas, no rescaldo da derrota dos leões, frente ao Famalicão confirmava a chegada do seu sucessor: Rúben Amorim. Chegava a Alvalade um treinador recheado de ideias novas, motivador, cativante e um ás na comunicação
No dia 5 de março era apresentado como treinador do Sporting Clube de Portugal. Nas suas primeiras palavras como técnico dos leões, Amorim preferiu destacar que era sim "fanático" por ganhar quando questionado sobre o passado benfiquista. Fintava assim com mestria as perguntas difíceis, dando mote a sucessivas conferências de imprensa serenas, afirmativas e em que nunca perdeu o foco. Nem com o Sporting a caminhar para o título, o treinador se deslumbrou preferindo sempre o discurso do, jogo a jogo é que o caminho, conseguindo assim dessa forma retirar a pressão do ombro dos seus jogadores. Os 'soldados verdes' responderam em campo, afirmativos, com uma extensão do treinador, alguém que lhes conhece a linguagem e que há bem pouco tempo também pisava a relva.
Consigo e na nova aventura em Alvalade trazia sobre os seus ombros uma enorme expetativa, até pelo investimento milionário, um número pouco habitual em Portugal (10 milhões de euros). Tem que se lhe gabar a coragem por ter assumido a equipa na parte final de uma época (19/20) em que os objetivos se tinham esfumado para os que vestem riscas verdes e brancas. O Sporting acabou por terminar o campeonato na quarta posição atrás do Sporting de Braga e aumentou a desconfiança. Mas Amorim, tranquilo e sorridente, ia trabalhando nos bastidores.
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A contratação polémica
Não foi só o dinheiro que foi pago na contratação de Rúben Amorim que fez virar cabeças no mundo do futebol português: A alegada falta de habilitação do treinador que em apenas uma época de carreira chegou ao Sporting - depois de passagens pelo Casa Pia (18/19) e SC Braga (equipa B e principal) esteve na mira da Associação Nacional dos Treinadores de Futebol.
Amorim foi respondendo às críticas demonstrando em campo que mesmo "o treinador estagiário pode bater os recordes de quem tem o 4º nível". No início do ano, em 2021, inscreveu-se no curso de nível 4 da FPF, passando a figurar como treinador principal na ficha de jogo nos jogos do Sporting.
Os 10 milhões que parecem migalhas em ano de título
Foram inúmeras as vozes que criticaram o investimento de 10 milhões de euros na contratação de Rúben Amorim. Afinal tratava-se de um técnico com pouca experiência, com apenas três meses de I Liga, depois de ter orientado o Sporting de Braga entre dezembro e março, mas com créditos firmados. Ainda foi a tempo de se sagrar campeão de inverno com a conquista da Taça da Liga.
A novela em relação à verba devida prolongou-se até ao dia 4 de setembro do ano passado, com os leões a chegarem a acordo para saldar a dívida de 10 milhões de euros para a transferência do técnico. Em 2021, os leões viriam a concretizar novo negócio milionário com os bracarenses, com a contratação de Paulinho, com Borja e Sporar envolvidos nesse negócio.
O desafio mais difícil
Se havia desafio que 'escaldava' era o de treinador do Sporting. Um clube em eterna convulsão interna, na ressaca dos acontecimentos em Alcochete, que tanto prejudicaram a imagem do emblema fundado em 1906. A sangria e troca de acusações entre os dissidentes e os apoiantes da direção liderada por Bruno de Carvalho e a nova administração liderada por Frederico Varandas instalaram um clima de sufoco e de guerrilha no clube lisboeta. A dança de treinadores sucessiva ao longo dos anos tornavam a cadeira de Alvalade não um sonho, mas sim um pesadelo.
Amorim silenciou todas essas vozes no "desafio mais difícil", mas no desafio mais desejado pelo técnico, de acordo com as suas palavras no dia da apresentação. O investimento era arriscado, numa espécie de 'All in' de Frederico Varandas, dada a delicada situação financeira do Sporting.
Amorim justificou plenamente a aposta. Fiel às suas ideias, nunca deixou de pensar pela sua cabeça, mesmo em momentos mais periclitantes - recorde-se o ciclo menos positivo em que o Sporting somou três empates em quatro jogos e viu a diferença diminuir para o segundo classificado FC Porto, de 10 para quatro pontos.
Quem desdenhou a sua contratação face ao investimento, agora tem que se calar (quase para sempre). Rúben Amorim deu o exemplo até para os colegas mais experientes de como se deve comunicar. Mesmo em momentos mais delicados não perdeu a boa disposição e foi sempre veemente - até na forma como defendeu incessantemente a contratação de Paulinho, numa das novelas da época em Alvalade -, ao contrário dos seus coléricos rivais que se perderam em críticas às arbitragens e com referências à pandemia da COVID-19. Atrás de si, contou com o apoio da estrutura, mas foram quase semore invisíveis os que ladearam um homem que soube sempre o próximo passo que tinha que dar. Contra o megalómano Benfica, num ano de investimento recorde na equipa de futebol e frente a um FC Porto, demasiado irritado, numa estratégia de contra tudo e contra todos, o treinador aproveitou o embalo para tirar o Sporting da seca de 19 anos.
A liderança de Amorim
Num plantel muito jovem, mas também onde pontificavam jogadores muito experientes como Jeremy Mathieu ou Sebastián Coates foi com naturalidade e serenidade que Rúben Amorim conseguiu impor a sua liderança.
Uma das características que se pode elogiar ao técnico é a sua frontalidade e a forma como fala com os jogadores. Mesmo Mathieu, que trazia atrás de si um enorme currículo, com passagens pelo Valência e Barcelona teve que trabalhar no duro, aquando da chegada do timoneiro, que exigiu ainda mais dos jogadores mais velhos, de acordo com um relato recente de Coates.
Em entrevista a uma televisão do Uruguai, o central destacou também a forma como o técnico nunca aponta as falhas dos seus jogadores. "Nunca critica os erros, pede que cada jogador dê o melhor e depois é ele quem decide."
o 3-4-3 de Amorim
Rúben Amorim manteve-se sempre fiel aos seus princípios táticos que transportou de Braga e aplicou no Sporting. Nessa forma de jogar, a equipa não se importou de oferecer por vezes a bola ao adversário para depois o ferir no momento da transição. Fulcrais para o sucesso do sistema foram as contratações de Pedro Goncalves, Nuno Santos e João Mário. Uma forma de se explanar em campo que dá muita segurança defensiva, já que a equipa passa a ter uma linha de cinco no momento defensivo e reduz muito o espaço e a profundidade do adversário. É também um esquema que favorece muito as linhas de passe para o jogador que está com a bola e facilita a saída na primeira fase de circulação. Os alas foram fundamentais, com o Sporting a acertar em cheio nas contratações de Pedro Porro juntamente com a afirmação de Nuno Mendes na equipa principal. Amorim fez com que a equipa acreditasse no processo, o que levou a uma comprometimento tático, um dos pontos-chave fundamental para o sucesso do 3-4-3.
A apostas nos jovens
Sem a capacidade financeira de FC Porto e Benfica, o caminho passou por apostar na prata na casa. Mas Amorim não apostou no jogador A, B, ou C, deu sim oportunidade a quem lhe deu mais garantias. E este título também se construiu logicamente nos bastidores, com as contratações cirúrgicas, começando logo pela de Pedro Gonçalves (ao Famalicão), a do experiente guarda-redes Ádan, pela vinda de Nuno Santos (ex-Rio Ave), pela aposta em Pedro Porro (cedido pelo City), pelo resgate de João Palhinha, pela contratação de Feddal, pelo regresso de João Mário. Alguns destes jogadores estavam desacreditados e com Amorim ganharam um nova luz. O técnico apostou em jovens sim, mas porque sentiu que acrescentavam qualidade à equipa: Foi assim com Daniel Bragança, com Matheus Nunes e mesmo com Dario Essugo que se tornou no mais jovem de sempre a vestir a camisola da equipa principal do Sporting. A determinada altura da época, Amorim colocou Gonçalo Inácio no trio defensivo, deixando o mais experiente Luís Neto no banco. Tornou possível o regresso de João Pereira no mercado de inverno, com o experiente jogador de 37 anos a ter um papel importante tanto dentro como fora das quatro linhas - Recordemos por exemplo a exibição do lateral em Vila do Conde frente ao Rio Ave.
Mesmo os que não jogavam, apoiavam quem não estava em campo e foi sempre assim. 'Onde vai um, vão todos'. Este Sporting foi sempre uma força aglutinadora que rumou para o mesmo lado e é esse o mérito de Rúben Amorim. Juntou todas as hostes em torno de um objetivo, e esse mérito não se pode tirar ao técnico que agora sucede a Boloni como novo campeão nacional na equipa principal do Sporting.
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