A presença incomum de uma equipa angolana na Volta a Portugal é sinal do progresso africano no ciclismo e também uma aprendizagem, mas o diretor desportivo diz que há “um longo caminho a percorrer”.
A correr nas estradas portuguesas, a Bai Sicasal-Petro de Luanda tem dado nas vistas ao entrar em fugas, ao conseguir um ‘top 10’, com o português Micael Isidoro, e por trazer Bruno Araújo, campeão angolano de estrada e filho do diretor desportivo, Carlos Araújo.
À Lusa, o diretor explica que em Angola se vai dando “os primeiros passos”, com a equipa a dividir-se entre provas do circuito africano da União Ciclista Internacional (UCI), como a as voltas a Marrocos, ao Ruanda ou ao Egito, e a presença “mais forte em Portugal”.
“Aqui é muito difícil, mas há que vir aprender e levar o conhecimento para Angola e África. As provas africanas já são muito bem organizadas, em Angola já temos os ‘chips’ nos corredores e transmissões ‘online’”, exemplifica.
Apesar de estar “no bom caminho”, com “uma estrutura organizativa bastante sólida para a realização de futuros grandes eventos”, Carlos Araújo alerta que em Angola e em África há “um longo caminho a percorrer”.
Mesmo estando “a evoluir”, a modalidade está ainda “muito longe da realidade europeia”, e a prova disso são problemas internos, até porque “algumas pessoas no ciclismo angolano não veem o crescimento com bons olhos”, num momento em que Angola se vai estrear nos Mundiais de estrada.
Outra formação em crescimento, mesmo tendo menos de um ano, é a sul-africana ProTouch, líder do ‘ranking’ UCI africano e também a correr a Volta, que tem a ambição, revela à Lusa o diretor desportivo ‘emprestado’ para Portugal, José Ferreira Rodrigues, de entrar no circuito europeu através de Portugal.
Na África do Sul reside o maior exemplo de sucesso, com a equipa Dimension Data no principal escalão do ciclismo mundial, o WorldTour, com oito sul-africanos e um eritreu, e uma segunda equipa de desenvolvimento, depois de ter existido como MTN-Qhubeka e ter vencido duas etapas na Volta a Portugal de 2012, com Reinardt van Rensburg, ainda na equipa.
Em países como Cabo Verde, Angola ou Guiné-Bissau, as federações locais têm feito um trabalho de aproximação à congénere portuguesa para protocolos de formação, treino e partilha de conhecimento.
O presidente da Federação Portuguesa de Ciclismo, Delmino Pereira, recorda à Lusa várias parcerias que nascem “por uma língua partilhada” e que vão desde a capacitação de comissários e diretores desportivos a estágios em Portugal e participação na Volta a Portugal de cadetes e de juniores.
“Há aqui um longo futuro pela frente, muito por fazer, mas em África há duas coisas fantásticas: muita popularidade e muita oferta de jovens atletas. Qualquer corrida é uma enchente e um mundo de alegria. O ciclismo cresceu assim em todos os países”, analisa o dirigente.
Delmino Pereira adianta ainda a existência de planos da UCI para “a organização dos Mundiais de países emergentes até 2022”, com Portugal “na linha da frente como potencial organizador”.
Presente no final da sétima etapa, no topo da Serra do Larouco, o presidente de Cabo Verde, Jorge Carlos Fonseca, falou das “boas condições” daquele país para a prática do ciclismo e manifestou a vontade de fomentar cooperação com Portugal nesse sentido, um desejo que também se vê em Angola e noutros países da lusofonia.
Carlos Araújo destaca, por seu lado, o papel de aprendizagem que a participação em provas portuguesas trouxe à equipa, um esforço “de que já se veem os frutos”.
O ‘veterano’ português Micael Isidoro é a cara mais conhecida da Bai Sicasal-Petro de Luanda, e depois de correr em Portugal foi encontrar “um nível significativo” em várias provas africanas, com corredores “bastante fortes a surgir de vários países”, dando o exemplo da Eritreia.
Nos últimos anos, têm surgido vários corredores eritreus no WorldTour e nas principais provas europeias, como Merhawi Kudus, a correr na Astana, ou Natnael Berhane e Daniel Teklehaimanot, agora na Cofidis, como principais exemplos, mas também Awet Gebremedhin, naturalizado sueco e a correr este ano a Volta pela Israel Cycling Academy.
Em Angola, diz Isidoro à Lusa, há “mais mediatismo” após a participação na Volta a Portugal.
“É um país em que, se as pessoas com poder gostarem, surgirão mais apoios e um investimento maior no ciclismo. São ciclistas como nós, têm qualidade e, com o trabalho adequado, podem dar um bom salto”, remata.
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