A 08 de abril de 2020, a Federação Portuguesa de Futebol largava a 'bomba' no futebol nacional: os campeonatos não profissionais, a Liga Feminina e os campeonatos de futsal, estavam cancelados, devido a pandemia de COVID-19. Esta decisão veio semear a discórdia no Campeonato de Portugal e lançar muitas dúvidas entre os 72 clubes que militam no terceiro escalão do futebol português. Alguns fizeram avultados investimentos para chegar a Segunda Liga, outros, menos ambiciosos, investiram para não voltar às distritais. Os clubes das distritais que sonhavam chegar aos campeonatos nacionais na próxima época, viram o seu trabalho de uma temporada 'ir por água abaixo'.
O SAPO Desporto foi tentar saber junto dos intervenientes como estão a lidar com esta decisão. Falámos com Ivan Cruz, guarda-redes do Esperança de Lagos, com o treinador do Alverca, Alexandre Santos, com Hugo Mendes, presidente do Lusitânia de Lourosa e ainda com Joaquim Evangelista, presidente do Sindicato dos Jogadores.
Todos por um e cada um... por si
Os clubes que lutavam pela subida à Segunda Liga lançaram vários modelos de promoção, cada um 'puxando a brasa à sua sardinha'. O organismo liderado por Fernando Gomes definiu que não haverá descidas no CdP (Campeonato de Portugal) mas garantiu que dois dos 72 clubes das quatro séries da prova irão ser promovidos à Segunda Liga. Não definiu quem, nem como, e isso só veio lançar mais dúvidas. O regulamento determina que os dois primeiros classificados das quatro séries se juntam num ‘play-off’. Os vencedores da primeira ronda vão às meias-finais, cujos vencedores garantem a promoção e o direito de disputar, entre si, o título. Sete equipas de cada série são despromovidas aos campeonatos distritais.
O Arouca e o Vizela defendem que deviam ser eles os promovidos por serem, entre os líderes das quatro séries, os que têm mais pontos (58 e 60 respetivamente).
O Olhanense, emblema que lidera a Serie D com 57 pontos, discorda. "O Campeonato de Portugal deve ser decidido em campo e a decisão da subida deve passar por um ‘play-off' com as melhores equipas, sejam elas quatro ou oito. A Federação Portuguesa de Futebol (FPF) deve olhar para a meritocracia dentro do campeonato", disse o presidente do clube, Luís Torres à Lusa.
O Praiense, que lidera a Série C, tem outra solução: caso não seja possível voltar a jogar esta época, dar mérito a quem estava na liderança, promovendo a subida dos primeiros classificados de cada série, o que levaria ao alargamento da Segunda Liga na próxima época.
Os capitães de Anadia, Alverca, Leça, Louletano, Sertanense, SC Espinho e Vitória de Guimarães B, em carta enviada à FPF, pediram um 'play-off' de subida alargado para 16 equipas, de forma a contemplar os terceiro e quarto classificados de cada série que ainda tinham esperanças de alcançar o 'play-off' nas nove jornadas que faltavam antes de tudo ser interrompido devido a COVID-19.
A Federação Portuguesa de Futebol (FPF) deve olhar para a meritocracia dentro do campeonato
Lusitânia de Lourosa, Vizela, Fafe, Sintrense, SC Espinho, Olhanense, Sertanense, Amora, Trofense e Leiria, todos do Campeonato de Portugal, enviaram também uma documento à FPF, com a seguinte proposta: alargar a Primeira Liga para 20 clubes em 2020/2021 (não haveria descidas esta época mas na seguinte desceriam quatro emblemas), a Segunda Liga, que não teria descidas esta temporada, seria dividida em duas séries e passaria a 28 equipas na temporada 2020/2021, já que iria receber as oito formações do Campeonato de Portugal que estão em posição de 'play-off' (Vizela e Fafe da Série A, Arouca e Lourosa da Série B, Praiense e Benfica Castelo Branco da Série C, Olhanense e Real da Série D).
Vitória de Guimarães B, SC Braga B e Marítimo B, a competir na Série A completariam o quadro de 28 equipas no segundo escalão do futebol nacional, que voltaria a ter a equipa B do Sporting, que será reativada na próxima época.
O Tirsense, que lidera a Série 2 da Associação de Futebol do Porto, considera que o futebol distrital deverá ter o mesmo tratamento que o Campeonato de Portugal, onde irão existir subidas à II Liga, pelo que lançou a seguinte sugestão:
- Em 2020/21, o Campeonato de Portugal seria composto por 95 equipas, dividas em cinco séries (mais uma do que atualmente), sendo 21 delas promovidas das Distritais. As restantes 74 seriam compostas pelas equipas que se mantêm da presente época (70), mais duas despromovidas da II Liga e dois clubes convidados.
- Os cinco primeiros classificados de cada série e os três melhores segundos classificados jogariam um play-off de acesso à II Liga 2021/2022, os dois finalistas seguiam para a II Liga, e o vencedor do 'play-off' seria o campeão do Campeonato de Portugal. Nas descidas, os sete últimos classificados de cada uma das cinco séries cairiam para os campeonatos distritais, ou seja, 35 equipas. Em 2021/2022, o Campeonato de Portugal teria 80 equipas, divididos por quatro séries (o mesmo número que existe atualmente, mas com mais equipas por série).
- Nesta época seguiriam para o 'play-off' de acesso à II Liga os dois melhores classificados de cada série, com os dois finalistas a seguirem para a II Liga. Os sete últimos classificados de cada série desceriam aos distritais - 28 equipas. Em 2022/2023 é quando, segundo o plano do Tirsense, o Campeonato de Portugal voltaria à normalidade, ou seja, ao sistema utilizado atualmente: 72 equipas, divididas em quatro séries.
Jogar é preciso, nem que seja à porta fechada
Quem está em posição de 'play-off' no Campeonato de Portugal defende que o mesmo se deve realizar, nem que seja a porta fechada. É o caso do Lusitânia de Lourosa, emblema de Santa Maria da Feira que investiu nas infraestruturas e no plantel, todo ele profissionalizado, para chegar o mais cedo possível à elite do futebol nacional.
Hugo Mendes, presidente do clube, 2.º classificado da Série B, só aceita um cenário de 'play-off' com oito equipas e deixou críticas aos clubes que pedem o alargamento para 16 emblemas.
"A nossa única preocupação é que a decisão da FPF [de se jogar o play-off] seja breve, mas sempre dentro daquilo que determinar a Direção-geral da Saúde. Agora aguardamos onde vamos disputar os jogos do ‘play-off’, seja à porta fechada, seja na Cidade do Futebol. Muita gente gostaria de estar na posição do Lusitânia de Lourosa, mas para isso teriam de trabalhar melhor para estar no lugar onde nos encontramos. Queremos competir nas quatro linhas e lutar por aquele objetivo que tanto trabalhámos ao longo da época", confidenciou Hugo Mendes, presidente do Lourosa.
O Alverca é outro emblema que fez um forte investimento para chegar à Segunda Liga através de um orçamento de 2,3 milhões de euros, superior a muitos emblemas da Segunda Liga. O treinador Alexandre Santos, que já foi técnico dos sub-23 do Sporting, foi chamado para liderar o projeto no início de 2020 e ia embalado rumo à promoção, com sete vitórias, dois empates e uma derrota em dez jogos. Um investimento forte que agora pode ficar sem rentabilização.
"Para o bem do futebol e salvaguardando a saúde, que está em primeiro lugar, seria muito importante para todos continuar a jogar, nem seja em julho ou agosto", diz Alexandre Santos ao SAPO Desporto, lembrando que a decisão da FPF irá "promover sempre uma elevada dose de injustiça". "Por isso insurgimos contra esta decisão já que equipas como o Alverca e outros, investiram muito neste campeonato, no futebol português, e de repente ficam fora da competição".
Mas as dúvidas quanto a atual época não se resumem ao Campeonato de Portugal. Alguns emblemas das Distritais estão à espera de novidades para saber o que fazer em relação à próxima temporada. A FPF já disse não haverá promoções ao CdP, mas quem fez investimento a contar com essa subida não está de acordo com esta medida.
Os líderes dos campeonatos distritais querem subir ao Campeonato de Portugal como planearam no início de 2019/2020, nem que para isso tenham de recorrer aos tribunais, como defendeu ao jornal 'O Jogo', José Luís Marques, presidente do São João de Ver.
Na altura da decisão da FPF, Pevidém (AF Braga), Vianense (AF Viana do Castelo), Mondinense (AF Vila Real), Vimioso (AF Bragança), SC Mêda (AF Guarda), Salgueiros (AF Porto Série 1), Tirsense (AF Porto Série 2), S. João de Ver (AF Aveiro), Carapinheirense (AF Coimbra), Marinhense (AF Leiria), Mortágua (AF Viseu), Alcains (AF Castelo Branco), Camacha (AF Madeira), Rabo de Peixe (AF Açores), Crato (AF Portalegre), Almeirim (AF Santarém), Juventude Évora (AF Évora), Oriental Dragon (AF Setúbal), Moura (AF Beja), Moncarapachense (AF Algarve) lideravam os campeonatos distritais das respetivas associações de futebol.
Fechados em casa e com salários em atraso, jogadores podem ficar cinco meses parados
A decisão de cancelar o campeonato veio agudizar ainda mais a frágil situação de muitos jogadores de um campeonato que se diz amador, mas que 'dá de comer' a mais de duas mil famílias. Alguns clubes têm SAD´s, com investidores estrangeiros, mas as principais receitas provêm de patrocínios de empresas das regiões onde estão inseridos e também de apoios das autarquias. Poucos são os clubes com plantel totalmente profissional e com contrato de trabalho, como são os casos do Alverca e do Lusitânia de Lourosa. Há emblemas com alguns jogadores a contrato, outros que se dizem amadores, pagam aos atletas uma espécie de subsídio, não existindo qualquer documento que sustenta a relação laboral. Estamos a falar, em alguns casos, de 200, 300 e 400 euros por mês.
17 dos 72 clubes que fazem parte do Campeonato de Portugal tinham admitido ao jornal 'O Jogo' (edição de 04 de abril) que não tinham condições para pagar os salários do mês de março, sendo que uma dezena deles admitiu ter mais que um salário em atraso. Uma dúzia estava a tentar apoios para pagar o mês de março, quatro tinham pago metade do mês passado. No total, 29 clubes não garantiam o salário de março, pelo que 870 pessoas (os planteis tem, em média, 30 elementos, entre jogadores, staff técnico e funcionários) iriam estar isolados em casa sem dinheiro para as necessidades mais básicas.
Com o desporto parado devido a pandemia da COVID-19, atletas vão tentando manter a forma em casa. Os clubes que almejam disputar o play-off de acesso à Segunda Liga continuam a trabalhar, embora de forma diferente. Já não se fazem "reuniões sobre sistemas de jogo, sobre análise de adversários", como nos explica o treinador do Alverca. O emblema ribatejano espera por um alargamento da fase de subida aos campeonatos profissionais para 16 clubes (é 3.º na Série D) para assim sonhar com a subida.
Com o passar dos dias, cresce a ansiedade, a incerteza sobre o futuro do clube e de cada jogador. O mais difícil, confessa Alexandre Santos, é manter os jogadores focados.
"Por muito que treinem em casa - gostam muito de treinar, às vezes para lá daquilo que lhes é pedido, - o que sentimos é que eles têm necessidade de sentir a relva, do treino habitual. O grande problema psicológico deste isolamento é o fato de não fazerem o que sempre fizeram, desde os sete anos: jogar futebol. E estão na expetativa de não haver mais jogos esta época, já que estavam com fortes possibilidades de disputar o ‘play-off’ de subida à Segunda Liga. Somos o 5.º clube mais pontuado de todas as séries, uma equipa convicta e com fortes hipóteses de chegar aos primeiros lugares", explica o técnico de 43 anos.
Como é que vou continuar a valorizar-me para continuar a ter trabalho, a ter sucesso?' É uma grande frustração
"Para os treinadores e jogadores que praticamente são todos profissionais e vivem somente disto, vermos uma situação em que não podemos exercer a profissão e sabendo que isto irá prejudicar fortemente o futuro do futebol e não podendo jogar esta época para mostrar o nosso valor, subir.... Todos os jogadores devem pensar: 'como é que vou continuar a valorizar-me para continuar a ter trabalho, a ter sucesso?'. É uma grande frustração", completa.
É em Lisboa que Ivan Cruz, guarda-redes internacional cabo-verdiano do Esperança de Lagos vai passando estes dias de isolamento. Longe de Cabo Verde, a sua terra natal, ter familiares na capital portuguesa ajuda-o nestes tempos de pandemia. O mais difícil, diz Ivan Cruz, "é não poder ir treinar e jogar, estar com os colegas, a convivência no balneário..."
Com passagens por Canelas2019, Cinfães, AD Oliveirense, este guarda-redes cabo-verdiano de 23 anos, formado no Gil Vicente, vê frustradas a possibilidade de saltar para um emblema de outro patamar.
"Estava a fazer a minha melhor época a nível sénior com a perspetiva de poder dar o salto, mas com o surgimento destes problemas, tudo se complicou. Ainda não sabemos o que vai acontecer. O Esperança de Lagos conta comigo para a próxima época, o presidente sempre mostrou vontade de eu continuar, e sempre mostrei vontade também em continuar. Agora é esperar e ver o que vai acontecer", explica ao SAPO Desporto.
Ivan Cruz, que continua a treinar cinco dias por semana (apesar de o clube apenas enviar planos para três treinos), não é dos jogadores em situação crítica. Garante que o clube nunca falhou com as suas obrigações, "mas agora como tudo ficou difícil para todos, o presidente está a fazer um esforço para tentar ajudar toda a gente".
Estava a fazer a minha melhor época a nível sénior com a perspetiva de poder dar o salto
A situação de salários em atraso é recorrente no Campeonato de Portugal. E é aqui que entra o papel do Sindicato dos Jogadores. O Fundo de Garantia Salarial foi acionado esta época para ajudar os jogadores dos sub-23 do Aves (7 775 euros) e ainda os atletas de cinco clubes do Campeonato de Portugal: AD Oliveirense (20 600 euros), Leiria (11 800), União da Madeira (11 400), Fátima (11 950) e Olímpico do Montijo (9 650), num total de 73 175 euros para jogadores com salários em atraso. O Praiense, outro emblema na mesma situação, não recorreu ainda ao Fundo de Garantia Salarial.
Apesar da situação difícil que se vive no Campeonato de Portugal, não há jogadores a passar fome, garante Joaquim Evangelista: "Nem permitiríamos isso. Tivemos o cuidado de criar um grupo de trabalho com os capitães das equipas onde cada um deles ficou com a responsabilidade de me dizer, no seu clube - estamos a falar de 72 clubes - quem estaria em situação apertada para de imediato podermos responder", explica ao SAPO Desporto.
O Praiense, líder destacado da Série C, assumiu que tem pagamentos por regularizar, mas garante que a situação não é "catastrófica". O presidente do clube da Praia da Vitória, Marco Monteiro, disse à Lusa que os atrasos se devem ao facto de o líder da SAD, Luis Oliver Albesa (empresário espanhol de 57 anos que detém 70 por cento da SAD), ter estado internado em Espanha com COVID-19.
Mas esta poderá não ser bem a realidade do Praiense. O jornal 'Record', na sua edição do dia 21 de abril, escrevia que os jogadores estavam a receber apenas uma refeição por dia. Diz aquela publicação, que falou com uma fonte anónima, que alguns atletas e o staff técnico não recebem desde dezembro de 2019. Seis futebolistas receberam metade do vencimento de fevereiro, escreve o 'Record', pelo que quase metade do plantel (dez jogadores) não quer voltar aos Açores para jogar o play-off (se houver play-off). As refeições dos atletas eram providenciadas pelo clube, mas a cozinheira, sem receber há meses, resolveu ir embora. Os vizinhos, cientes da situação, têm ajudado os jogadores como podem, providenciando-lhes refeições e alimentos para confecionarem, diz aquele jornal.
Se não for possível retomar as nove jornadas que faltam das quatro séries, jogadores de 64 das 72 equipas podem ficar cinco meses sem competição, na melhor das hipóteses, isso se a próxima época começar em agosto. São quase dois mil, entre jogadores, staff técnico e funcionários.
Além da vertente financeira, há que ter em atenção ao estado mental dos jogadores. Um estudo recente da Federação Internacional dos Jogadores Profissionais de Futebol (FIFPro) sublinha que os futebolistas têm revelado crescentes sintomas de depressão desde a interrupção das competições devido à pandemia da COVID-19, mas reatá-las sem segurança será ainda pior. Em Portugal, o Sindicado dos Jogadores de futebol criou uma linha de apoio, através do número 933009590, para quem sente "ansiedade, medo ou angústia devido ao isolamento social".
FPF vai ajudar... quem cumpre
No mesmo dia em que a Federação Portuguesa de Futebol (FPF) revelou o cancelamento dos campeonatos seniores não profissionais de futebol e futsal da época 2019/20, o organismo liderado por Fernando Gomes anunciou a criação de fundo de apoio aos que militam naquelas provas no valor 4,7 milhões de euros (ME) para ajudar a minimizar os efeitos da pandemia de COVID-19. O fundo viria a ser reforçado com a doação de metade do prémio de qualificação para o Euro2020 da Seleção Nacional (cerca de um milhão de euros), numa iniciativa de Cristiano Ronaldo que os restantes jogadores da Seleção aceitaram.
A este fundo de apoio soma-se a linha de crédito de um milhão de euros que a FPF abriu em 19 de março, também destinada aos clubes não profissionais de futebol e de futsal, para que possam cumprir "com os compromissos estabelecidos para esta época com jogadores e treinadores".
Os clubes do Campeonato de Portugal poderão receber um total de 35.250 euros, com parcelas de 17.625 a serem disponibilizadas em maio e em junho. Mas, para tal, terão de cumprir um conjunto de regras estabelecidas pela FPF, criadas com o objetivo de obrigar os clubes com salários em atraso a regularizarem a situação antes de se poderem financiar na FPF.
- Os clubes não profissionais têm que provar a inexistência de salários em atraso até final de fevereiro de 2020 e, após terem acesso ao financiamento, terão que ser cumpridores nas próximas quatro temporadas, mantendo todas as equipas em atividade.
- Na primeira época, os emblemas que utilizarem o fundo terão que pagar 10% do valor disponibilizado pela FPF, seguindo-se 25% e 32%, na segunda e terceira, respetivamente. Os restantes 33% serão a fundo perdido, mais 8% do que inicialmente previsto.
- Os emblemas dos campeonatos de futsal masculinos e femininos podem receber 24.000 euros, o triplo do atribuído ao segundo escalão de futebol feminino (8.000) e também acima da segunda divisão de futsal (6.300).
- Os montantes agora recebidos pelos clubes no âmbito da linha de crédito vão ser descontados nos valores globais do fundo, de acordo com o regulamento aprovado pela FPF.
Joaquim Evangelista explica que se os clubes não recorrerem ao fundo, os jogadores podem e devem interpelar o Sindicato para, por via do fundo de garanta salarial, receber os salários de abril e maio.
Campeonato de Portugal 'grita' por mudanças
Longe do mediatismo que é dado aos campeonatos profissionais de futebol (I e II Ligas), o Campeonato de Portugal é um misto de profissionalismo com amadorismo. Um amadorismo falso já que, não sendo uma competição não profissional, os jogadores vivem dessa atividade.
"O Campeonato de Portugal tem problemas estruturais, muitas assimetrias, não tem um modelo de licenciamento, há uma ausência total de controle, uma precariedade de vínculos desportivos. Tem vindo a ter um aumento de investimento estrangeiro desregulado e oportunista que assenta muito no recrutamento de jogadores estrangeiros, com os clubes a servirem de ‘barrigas de aluguer’ para desenvolver esses talentos", critica Joaquim Evangelista, presidente do Sindicato dos Jogadores.
Essas assimetrias são visíveis nos seus 72 clubes: há emblemas com estruturas fortemente profissionalizadas que têm o objetivo de chegar aos campeonatos profissionais. Há outros, mais modestos, que apenas lutam para não cair nas Distritais.
Há já alguns anos que treinadores e dirigentes têm vindo a apelar para mudanças na estrutura completiva do Campeonato de Portugal. Dos 72 emblemas que começam a prova, apenas dois garantem a subida à Segunda Liga. Um clube que invista muito e consiga fazer uma primeira fase sem problemas, pode ver todo o investimento perdido em apenas um jogo: o primeiro dos 'play-off'.
"Há várias equipas da Campeonato de Portugal com melhores condições a nível de salários e estruturas que os da Segunda Liga. Não faz sentido subirem apenas duas. Com o atual modelo, uma equipa pode fazer um campeonato espetacular, vai ao 'play-off', o guarda-redes tem uma má saída, é expulso, a equipa perde e todo o trabalho de um ano 'vai por água abaixo'. Isso já aconteceu, equipas que ganharam tudo e perderam no penúltimo jogo, e é muito injusto", explica-nos Alexandre Santos.
O técnico de 43 anos espera que se use esta paragem provocada pela pandemia de COVID-19 para "acelerar o processo, que já estava em marcha, de renovação e reformulação do Campeonato de Portugal".
Esta é uma boa oportunidade para separar as boas práticas dos abusos de clubes que não têm lugar nem no CdP nem em qualquer campeonato
O Lusitânia de Lourosa é um dos emblemas profissionais do Campeonato de Portugal. O presidente Hugo Mendes tem vindo a investir muito no clube, de forma a coloca-lo, o mais rapidamente possível, na elite do futebol nacional, mas "vê com bons olhos as mudanças na estrutura da competição".
"O Lusitânia quer estar nos campeonatos profissionais já na próxima época, mas, para quem fica, vê com bons olhos as mudanças na estrutura da competição. Tem de haver uma proteção à volta desta prova, muito mais rigor, um nível de profissionalismo muito mais avançado que vai repercutir no futebol português. Haver 72 clubes a lutar apenas por dois lugares e ainda terem de ir a 'um play-off', não é muito justo, principalmente para quem faz grandes investimentos para subir aos campeonatos de Portugal", confessa Hugo Mendes.
Também Joaquim Evangelista pede uma reflexão sobre esta prova, garantindo que a Federação Portuguesa de Futebol já tem em marcha um plano de reformulação do Campeonato de Portugal que será anunciado em breve.
"Temos de olhar para esta crise como o momento para fazer a reforma do Campeonato de Portugal. Estamos, há já algumas semanas a fazê-lo, em conjunto com a Federação. Vão haver muitas novidades em breve, quer no modelo dos quadros competitivos, quer no modelo de licenciamento para o futuro, que permite garantir o cumprimento de obrigações essenciais e condições de natureza desportiva para os jogadores. Esta é uma boa oportunidade para separar as boas práticas dos abusos de clubes que não têm lugar nem no CdP nem em qualquer campeonato. É importante credibilizar a competição e dar garantias aos jogadores para que eles saibam o que contar", explicou ao SAPO Desporto.
Para já, resta esperar pela decisão da Federação Portuguesa de Futebol sobre como e quem irá ser promovido à Segunda Liga. Em casa, fechados, sem poder fazer o que mais gostam, a ansiedade vai crescendo entre os jogadores. Nestes tempos de pandemia, pede-se-lhes muita coragem, assim com a todos os portugueses em isolamento. Primeiro, a saúde. O futebol, logo se vê.
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