O Paris Saint-Germain apurou-se, pela primeira vez na sua história, para a final da Liga dos Campeões, ao vencer nas meias-finais o Leipzig por 3-0. O apuramento inédito dos parisienses acontece precisamente no ano em que celebra o seu 50.º aniversário, num percurso de altos e baixos que atinge agora o seu ponto mais alto, com a possibilidade de erguer, já neste domingo, o primeiro troféu da Champions. Para isso, a equipa de Thomas Tuchel terá de bater o poderosíssimo Bayern Munique, que já foi cinco vezes campeão europeu, a última vez em 2012/2013.
Como tudo começou
O Paris Saint-Germain nasce em 1970 graças a cerca de 20 mil assinaturas de pessoas que clamavam por um clube de futebol à altura dos pergaminhos da cidade. Paris era uma referência na arte, na literatura, no cinema, na música e na moda, mas no desporto não conseguia rivalizar com outras cidades como Lyon, Marselha ou Bordéus, e os seus grandes clubes. Até porque os grandes emblemas parisienses como o Olympique de Paris, o Club Français e o CA Paris tinham desaparecido com o advento da I e da II Guerra Mundial.
Foi então que um grupo de empresários decidiu firmar uma parceria com o Stade Saint-Germain, situado em Saint-Germain-en-Laye, a 15 km a oeste da capital, que acabara de subir à segunda divisão francesa, e que contou logo com um forte apoio financeiro. Nascia assim o Paris Saint-Germain Football Club, no dia 12 de agosto de 1970. A equipa misturava jogadores amadores de Saint-Germain e profissionais contratados pelos dirigentes parisienses e logo na época de estreia ganhou a Ligue 2 e subiu à primeira divisão.
Com o rápido sucesso da equipa vieram também os primeiros problemas entre as duas fações do clube, que levaram a uma cisão entre 'profissionais' e 'amadores' em 1971/72. Os primeiros juntaram-se ao CA Monteruil e permaneceram no principal escalão sob o nome de Paris FC, enquanto os segundos continuaram como PSG, mas viram-se relegados para a terceira divisão.
No entanto, não foi preciso esperar muito tempo para o PSG regressar ao convívio dos grandes, com o apoio de Daniel Hechter, famoso estilista e designer de Paris, que assumiu as rédeas do clube como diretor geral. Foi ele o responsável pelo crescimento do PSG numa primeira fase, quando o clube regressou à primeira divisão, em 1974 - curiosamente o Paris FC era despromovido nesse mesmo ano. Foi o próprio Hechter quem concebeu e desenhou o equipamento do PSG com as cores azul, vermelho (cores de Paris) e branco (cor de Saint-Germain-en-Laye).
Aos poucos, o clube começou a atrair nomes sonantes como Mustapha Dahleb, do Sedan, e Carlos Bianchi, do Stade Reims. Bianchi chegava com o estatuto de melhor marcador da Ligue 1 em três ocasiões pelo Reims - e seria mais duas pelo PSG. Foi também nesta altura que o Paris Saint-Germain se mudou oficialmente para o Parque dos Príncipes, depois dos primeiros anos no Stade Municipal Georges Lefèvre.
Em 1978, um escândalo envolvendo os valores não declarados nas bilheteiras do Parque dos Príncipes levou ao afastamento de Daniel Hechter da direção do clube, com Francis Borelli a chegar-se à frente. Nesse ano surgia a "Kop of Boulogne" (KOB), uma bancada onde se juntavam os mais novos, mas também os mais irreverentes aficionados do PSG, que foram os primeiros a acompanhar a equipa na sua condição de visitante. E o KOB rapidamente se tornou no símbolo do hooliganismo francês, com episódios de violência que marcaram a história do clube durante os anos 80.
Dos primeiros títulos à crise
No campo, contudo, o PSG dava início a uma década de afirmação. Mesmo antes de contratar Safet Susic, que viria a ser um dos melhores estrangeiros que a Ligue 1 já viu, o emblema parisiense conquistava o seu primeiro título em 1982, ao erguer a Taça de França na final contra o Saint-Étienne. Era a primeira vez em 33 anos que um clube de Paris conquistava um troféu.
No ano seguinte, o PSG voltou a vencer a Taça - 3-2 sobre o Nantes - e estreou-se na Europa, mas o grande momento do clube chegou em 1985/86, ao sagrar-se pela primeira vez campeão nacional francês. Com Gérard Houllier no comando técnico e 20 golos de Dominique Rocheteau, o PSG conseguiu uma incrível sequência de 26 jogos sem perder, tendo sido derrotado apenas cinco vezes.
A estreia na Taça dos Campeões Europeus aconteceu na temporada seguinte, com uma derrota logo na primeira ronda, diante do Vítkovice, da antiga Checoslováquia. A partir daí o clube entrou numa fase de declínio, ao ponto de chegar a lutar para não descer de divisão (salvou-se por dois pontos). Simultaneamente nascia a primeira claque ultra do PSG, os 'Boulogne Boys' , que deu início a uma escalada de violência que levou os restantes adeptos a divorciarem-se do clube.
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A chegada do Canal+ e de Artur Jorge
Em 1991, Borelli deixou a presidência do PSG, abrindo o caminho para a chegada do investimento do Canal+, o maior grupo de comunicação social em França. Artur Jorge, que se sagrara campeão europeu com o FC Porto, foi o escolhido para comandar uma equipa recheada de craques onde se destacavam Valdo, Ginola e Le Guen. George Weah chegaria no ano seguinte, acompanhado de Bernard Lama, Vicent Guérrin e Alan Roche, e foi assim que o PSG deu início a uma nova era dourada.
O mítico 'Rei Artur' fez a sua presença notar-se em Paris entre 1991 e 1994, tendo conquistado uma Liga Francesa em 1994, na qual perdeu apenas três vezes em 38 jornadas, e uma Taça de França em 1993. Na Europa, uma histórica vitória por 4-1 sobre o Real de Madrid garantiu a primeira presença de sempre dos parisienses numa meia-final, neste caso da Taça UEFA, em 1992/93 - acabaram derrotados pela Juventus.
Artur Jorge acabou por sair em 1994, dando lugar a Luis Fernández, antigo jogador dos parisienses. Com Fernández o PSG eliminou o Barcelona de Johan Cruyff em 1995, atingindo pela primeira vez uma meia-final da Liga dos Campeões. Acabou por ser derrotado pelo AC Milan.
No ano seguinte, o PSG chegava à sua primeira final europeia, batendo o Rapid Viena em Bruxelas, por 1-0, conquistando assim a extinta Taça das Taças. Um ano depois, chegou novamente à final da competição, e já com Ricardo Gomes no banco, o PSG não conseguiu bater o todo-poderoso Barcelona de Bobby Robson, Ronaldo Nazário e Luís Figo.
A travessia do deserto e o 'Ciclone dos Açores'
Na segunda metade da década de 90, o Paris Saint-Germain começou a ter dificuldades para manter as suas principais estrelas, que se deixaram atrair por ligas mais competitivas como a inglesa ou a italiana. Djorkaeff ficou apenas uma temporada antes de rumar ao Inter, George Weah foi contratado pelo Milan, David Ginola e Bernard Lama mudaram-se para Premier League, por Tottenham e West Ham, ao passo que Raí voltou para o São Paulo.
O sucesso europeu deu lugar a uma longa travessia do deserto. Artur Jorge ainda voltou a comandar o clube em 1998/99, porém sem conseguir igualar o sucesso alcançado na primeira estadia. Ronaldinho Gaúcho foi contratado em 2001, mas saiu duas épocas depois para o Barcelona.
O regresso aos títulos só aconteceu em 2004, um ano depois da saída do brasileiro, com a conquista da Taça, depois de um segundo lugar no campeonato. Um dos culpados desta retoma? Pedro Pauleta, que tinha sido contratado no início da temporada ao Bordéus, e que viria a tornar-se o melhor goleador do emblema parisiense (entretanto ultrapassado por Zlatan Ibrahimovic e Edinson Cavani).
Nas cinco épocas que esteve em Paris, o 'Ciclone dos Açores' tornou-se numa das principais figuras da história do clube, um facto suportado pela relação que manteve junto dos adeptos. Para se ter noção do impacto do avançado português, a revista France Football levou a cabo um inquérito online onde questionava os apoiantes do Paris Saint-Germain sobre quem seria o melhor avançado da história do clube. Pauleta ficou no topo da votação, com 36 por cento dos 10.771 votos, tendo superado Ibrahimovic.
Foi precisamente no PSG que o açoriano decidiu 'pendurar as chuteiras' em 2008, após duas Taças de França e uma Taça da Liga.
Por um punhado de petrodólares...
Em 2006, o Canal+ decidiu vender o Paris Saint-Germain a um grupo de investidores, o que deu início a um novo período de escassos sucessos. O clube ficou duas vezes seguidas perto da despromoção até ao virar da década, altura em que somou mais uma Taça da Liga, em 2008, e uma Taça de França, em 2010, tendo ainda recuperado algum fulgor na Ligue 1 com campanhas medianas e um quarto lugar em 2010/11.
Mas era preciso mais. E o ponto de viragem chegou sobre a forma dos petrodólares da Qatar Investment Authority. A empresa, dirigida por um primo do sheik e cujo objectivo passa por investir milhões na produção de gás e petróleo no Qatar, comprou o PSG em junho de 2011 e designou Nasser Al Khelaifi como presidente do clube.
Al Khelaifi, que também lidera a Federação de Ténis do Qatar (QTF) e a cadeia televisiva Al Jazeera Sports, é sinónimo de desporto e negócios milionários tanto no Qatar como no resto do mundo. O objetivo era muito simples: dotar Paris de um clube de topo, capaz de ombrear com outros colossos europeus.
Carlo Ancelotti, então de saída do Chelsea, foi o primeiro a deixar-se atrair pelo projeto ambicioso do clube, que nesse verão gastou 100 milhões de euros em reforços como Thiago Motta, Sissoko, Gameiro Matuidi e Javier Pastore.
O PSG foi vice-campeão francês na primeira temporada de Ancelotti e de Al Khelaifi, recuperando o título no ano seguinte, quando já contava com Zlatan Ibrahimovic, outro nome incontornável da história do clube. Os milhões continuaram a ser investidos: mais €42 milhões em Thiago Silva, outros €40 milhões em Lucas Moura, quase €30 milhões em Ezequiel Lavezzi. E o excelente negócio de Marco Verratti, que custou apenas €12 milhões.
E o PSG chegou ao tão desejado título de campeão francês em 2012/13, que repetiria nas três temporadas seguintes. Nesse mesmo período, o clube tentava chegar mais longe na Liga dos Campeões, mas nunca conseguiu ir além dos quartos de final.
Em 2016/17, a hegemonia parisiense foi destronada pelo Mónaco de Leonardo Jardim, e o PSG entrou numa fase de rutura: Ibrahimovic saía para o Manchester United, e Laurent Blanc, substituto de Ancelotti, foi despedido para dar lugar Unai Emery. E Al Khelaifi voltou a investir, batendo todos os recordes no que ao mercado de transferências de futebol diz respeito.
Em agosto de 2017, oficializava-se a transferência mais cara da história do desporto-rei: Neymar deixou o Barcelona para rumar ao Paris Saint-Germain a troco de 222 milhões de euros. Kylian Mbappé foi outro dos negócios daquele defeso. O avançado do Mónaco chegou a Paris no último dia do fecho do mercado, a título de empréstimo, mas o clube parisiense acordou o pagamento de 180 milhões de euros ao Mónaco na próxima temporada.
Questões relativas ao fair-play financeiro foram levantadas, mas a verdade é que o PSG partiu confiante para recuperar o domínio no futebol francês, sagrando-se campeão nessa mesma temporada e em todas as que se seguiram. Mas continuava a faltar a tão desejada Liga dos Campeões. E agora, o Paris Saint-Germain nunca esteve tão perto de levantar o 'caneco', sendo esta a primeira final em 50 anos de história do clube. Será este domingo?
O pontapé de saída da final entre PSG e Bayern Munique tem início marcado para as 20 horas deste domingo. Pode acompanhar todas as incidências da partida no SAPO Desporto.
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